quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015

Pensões - (1) - Resposta a um comentário



Por ser algo longa, aqui ficam alguma considerações acerca do comentário ao último post deixado por Torres da Silva, o qual agradeço.

Claro que não defendo que se deve punir quem é reformado, mas também entendo que não se devem continuar a sobrecarregar os trabalhadores no ativo e as gerações futuras com os erros cometidos no passado.

Em jeito de curiosidade, costumo dizer que a questão das pensões não é umm problema político mas de Matemática. E, talvez por isso, seja de tão difícil resolução pela classe política que nos tem governado.

Ora, eu não sou especialista do ponto de vista técnico sobre estes assuntos, mas curioso e defendo uma alteração algo profunda do sistema de pensões. Por ser um tema complexo, deixo alguns pontos que refletem a minha opinião.

a. As causas do desequilíbrio entre as contribuições e os pagamentos é a existência de um sistema de pensões que, quanto a mim, necessita de uma reforma mais ou menos profunda.

b. Atualmente, os trabalhadores no ativo pagam as reformas atuais e, neste sistema, esperam que na altura da sua própria pensão existam outros que lhes paguem as pensões.

c. Sabe-se que é insustentável o sistema atual, e sobrecarrega os trabalhadores no ativo e as gerações futuras.

d. Para tentar resolver, acho que têm de tomar-se algumas medidas, tais como:

  1. convergência dos regimes da CGA e da SS, não há razão para umas pensões serem calculadas de uma maneira e outras de outra;
  2. as pensões atuais, de valor mais elevado (por exemplo acima de 2x ou 3x o salário mínimo) têm de ser chamadas a contribuir para o sistema atual. Uma espécie de CES, tal como já existiu mas que penso que foi vetada pelo Tribunal Constitucional;
  3. a fórmula de cálculo das pensões futuras tem de ser revista, de modo a que reflitam, de modo mais realista, os descontos efetuados ao longo da carreira contributiva. Isto tem de ser feito gradualmente, para que as pessoas a quem faltam poucos anos não tenham um corte significativo nas sua pensão. Isto, na CGA já está feito, mas tem de ser revisto e generalizado;
  4. a pensão deverá ser contruída com base em 3 parcelas: P1: descontos obrigatórios para a SS nos moldes atuais, P2: descontos obrigatórios (com %% variável do rendimento) para um regime de capitalização pessoal (público ou privado) e P3: descontos facultativos para um regime de capitalização pessoal.
Comentários:
  • O primeiro ponto, só em poupanças de estrutura e pessoal, traria poupanças avultadas, para além da questão de equidade entre cidadãos.
  • O segundo ponto traria alguma solidariedade entre cidadãos, na medida em que diminuiria as discrepâncias entre rendimentos de pensões.
  • O terceiro ponto traria mais realismo ao montante das pensões futuras, tendo em vista o aumento da esperança média de vida.
  • O quarto ponto traduz a responsabilização que cada um teria na sua própria pensão. Já existem os PPR e o Regime Público de Capitalização, o primeiro com muitos aderentes pela via dos benefícios fiscais e do marketing da Banca e dos Seguros e o segundo com pouquíssimas adesões (eram 7.389 no fim de 2013) pelo facto da pouca divulgação deste produto, pouca preocupação da população em geral com estas questões e, claro, fraca capacidade de poupança de cada um.
Mas, principalmente, penso que falta coragem política para mexer neste problema. A população em geral teria de ser envolvida, informada e levada em conta nas suas expectativas para que se pudesse avançar.

2 comentários:

Torres da Silva disse...

Meu caro blogger,
Respondo à sua resposta.
Primeiro, saliento a elevação com que aborda o problema.
Segundo, espero que me dê alguma razão, quando eu disse que temos de abordar as causas e não olhar apenas para os efeitos. Se abordarmos as causas, ficaremos a saber, porque é também, repito, também, um problema de Matemática, embora, no essencial, seja um problema político e de Política.
Veja só.
Como podemos assistir à alegação, superficial e "tremendista" de que "não há dinheiro" para as pensões da CGA, se foi o próprio Estado a esquivar-se a pôr na CGA a sua contribuição como entidade patronal, durante anos e anos, poupando aí cerca de 16 mil milhões de euros, pelas contas que se podem inferir dos relatórios da própria CGA, entre 1997 e 2012, em 16 anos?
E que dizer do facto de os dinheiros da Segurança Social (que não pertencem ao Estado) terem sido utilizados para jogo na Bolsa ou para dar de garantia da dívida soberana, conforme portaria de Vítor Gaspar de 29/07/2013? Diz quem já fez contas (e são todos personalidades com provas dadas) que se está a falar de um desfalque de cerca de 100 mil milhões de euros.
De modo que, para começo da conversa, o governo deveria - mas não lhe dá jeito - reconstituir os fundos que financiavam o pagamento das pensões, antes de recorrer à CES, punindo quem não é culpado dos desmandos.
Sim, concordo consigo, se não houver reforma da Segurança Social - e também apoio que seja feita gradualmente -, o sistema de pagamento de pensões irá rebentar um dia destes.
Mas o que me preocupa também é que se andem a atirar pedras, escondendo a mão, convocando os mais novos, ameaçados pelo colapso, para se rebelarem contra o sistema intergeracional das pensões, consagrado na Constituição, "vendendo" raciocínios para convencerem ingénuos de que tudo está em cortar aos actuais pensionistas para "melhorar" as coisas.
Não. Vamos, todos juntos, lutar para que o Estado assuma a responsabilidade do que fez ou não fez, recapitalizando o que descapitalizou e continua a descapitalizar.
Continua, sim, como, por exemplo, quando aumenta de 485 para 505 euros o montante do salário mínimo e põe as receitas da Segurança Social a pagar às entidades patronais a TOTALIDADE da contribuição patronal, se contratarem pessoas por 505 euros. Eloquente.
Neste debate, há muita Matemática e Aritmética, é verdade, mas há também muita informação que está sonegada ao grande público.
Se me permite, recomendo que leia os acórdãos do TC mais recentes sobre a convergência de pensões da CGA (19/12/2013), chumbada para as pensões já atribuídas, e sobre a contribuição de sustentabilidade (14/8/2014), chumbada por 10 votos contra e 3 a favor, quanto à "reforma" das pensões com cortes pequeninos, a crescerem ao sabor da tão propalada falta de dinheiro, logo que o governo quisesse...
Numa reforma tão delicada, como a classifica, devemos, se quisermos ser consequentes, falar, primeiro, das causas, em especial, da descapitalização colossal promovida pelo próprio Estado, e, depois, mas só então, abordar o que deve ser feito para tornar mais sustentável e menos arriscado o pagamento de pensões.
Também por isso, me atrevi a dizer que ninguém quer a punição de ninguém: nem dos actuais pensionistas, nem, acrescento eu agora, dos futuros pensionistas.
Um abraço.

Trader disse...

Caro Torres da Silva,

concordo em geral com o que diz e, pelo que vejo, está muito mais por dentro deste tema das pensões do que eu.

O blog começou como alerta para o crescimento da dívida pública, e a questão das pensões e dos salários dos trabalhadores do Estado vem sempre à baila.

Não estou a par da portaria do ex-ministro Vítor Gaspar que refere mas, a ser como escreve, algumas explicações são devidas pelo actual governo.

Quanto à descapitalização dos fundos de pensões públicos (CGA e SS), parece ser o grande problema de fundo que, como refere, tem causas diferentes mas a mesma consequência: falta dinheiro agora por decisões erradas há uns anos.

Penso que a questão é sempre a mesma: quem nos governa não é suficientemente sério para dizer a verdade aos cidadãos e ainda toma, conscientemente, decisões que lesam os seus interesses e direitos.

Sem me alongar mais, que o tempo não é muito, deixo ainda um dado que desconhecia e que retirei so site da CGA:

Ao cálculo da parcela da pensão de aposentação dos subscritores inscritos na CGA até 31 de agosto de 1993 relativa ao serviço prestado a partir de 1 de janeiro de 2006, bem como das pensões dos subscritores inscritos na CGA a partir de 1 de setembro de 1993, são aplicáveis as regras em vigor para o regime geral da Segurança Social.

A reforma dos trabalhadores do Estado já está a ser, pelo menos de forma parcial, calculada pelas regras da SS o que, a prazo, irá acabar com a injustiça de haver duas formas distintas de cálculo.

Bem haja pelos comentários,
até breve!